Paulo Brusck
Paulo
Bruscky nasceu em Recife, em 1949, onde vive e trabalha. Artista, ativista e
renomado arquivista, Bruscky trabalha com diversas mídias, que incluem
desenhos, performances, happenings, copy art e fax-art, arte postal,
intervenções urbanas, fotografia, filmes, poesia visual, experimentações
sonoras e intervenções em jornais, entre outras experiências. Sempre testando e
estendendo os limites da prática artística, se mantém consistentemente à margem
do mercado, promovendo a circulação de arte fora dos circuitos institucionais e
desenvolvendo trabalhos, em muitos casos, efêmeros. Apresenta sua primeira
exposição em 1970, na Galeria da Empetur de Recife, e a partir dessa data
começa a trabalhar em colaboração com Daniel Santiago pelas próximas duas
décadas. Seu trabalho desenvolve-se, em grande parte, no espaço público, onde
propõe diversas ações, a maioria das quais com participação do público. Em 1973
ingressa no Movimento Internacional de Arte Postal e, desde então, além de
entrar em contacto com artistas internacionais do Fluxus, entre outros,
participa de uma infinidade de exposições de arte postal em todo o mundo. Em
1974 organiza Nadaísmo e, em 1975,
a Primeira Exposição Internacional de Arte Postal, em
Recife, que teve muitas outras edições posteriores. Sua produção em Super 8, vídeo e rádio também
está incluída em inúmeros festivais e eventos internacionais, inclusive aqueles
que o próprio Bruscky organiza International Video Art I e Internacional
Ra(u)dio Arte Show II, Recife, 1979. Também publica livros e é um forte
defensor de mostras de livros de artistas, que é regularmente convidado e que
ele também cura. Entre outros, participaram Libres d'artiste / Artistas'
Livros, do Centro de Documentação Atual D'Arte, Barcelona, 1980, e Bookworks
82, Fundação de Arte de hoje, Philadelphia, 1982. Recife, em 1981, organizou a
Exposição Internacional de Poemas em Out-Door Visuais
- ART-porta, um evento que contou com o apoio da Cidade do Recife, que
consistiu na instalação de cento e oitenta cartazes por toda a cidade com
projetos artistas de vinte e cinco países, incluindo a Christo e Regina Vater,
entre outros. Em 1981 ele recebeu o Guggenheim Fellowship por um ano e vive em Nova York. Nesse
mesmo ano ele foi convidado a participar na XVI Bienal Internacional de São
Paulo, onde mais uma vez em 1989 e 2004, com uma sala especial que reconstrói
seu rico ateliê. Em 1984 e em 2009 ele foi convidado para a Bienal de Havana,
Cuba. Entre suas exposições, na última década, incluem, entre outras: Bienal
Brasil Século XX, Fundação Bienal de São Paulo (1994); Arte Conceitual e
Conceitualismos: 70 anos não acervo MAC / USP, Galeria de Arte do Sesi, São Paulo
(2000), Anos 70: trajetória, Itaú Cultural, São Paulo (2001); 27 Panorama Atual
de Arte Brasileira, Museu de Arte Moderna de São Paulo (2001). Em 2005 ele
organizou a exposição Paulo Bruscky: Projetos e Propostas, Galeria Ibero
Camargo, Porto Alegre (2005), e em 2006 publicou o livro Paulo Bruscky: Arte
Arquivo e Utopia, Cristina Freire, seguidas pela exposição antológica curadoria
de Paulo Freire com Bruscky: Ars brevis, Museu de Arte Contemporânea da
Universidade de São Paulo (2007).
VT experimental no
qual o artista, usando o eletroencefalógrafo, propõe um trabalho gráfico direto
do cérebro para o papel sem usar intermediários (mãos, pés, etc.).
Entrevista
com Paulo Bruscky*
Por
Fernanda Lustosa
Quando
se fala em Paulo Bruscky,
não há como não pensar nas artes postal e xerográfica. Pioneiro no Brasil nessa
vertente, foi talvez o artista mais atuante junto ao Fluxus, movimento que
discutiu a arte conceitual em suas manifestações mais diversas e afastadas do
sistema de arte. Autodidata, como ele mesmo se define, ganhou a Bolsa
Guggenheim de Artes Visuais e desenvolveu pesquisas em Nova Iorque e
Amsterdã. Organizou a1ª Exposição Internacional de Arte Postal, no Recife, em
1975, e enfrentou a censura na ditadura militar até que a arte correio pudesse
se estabelecer novamente. Com um rico e vasto trabalho,o artista, que usa
diversos recursos e que lançou a pergunta “O que é a arte? Pra que serve?”, diz
afinal não saber responder, mas mostra que, para ele, arte e vida são uma só.
DASARTES:
O senhor é um dos protagonistas da arte postal no Brasil. Como se deu isso?
PAULO
BRUSCKY: Desde que eu publiquei, na década de 1960, o poema-processo dentro do
movimento, a arte correio já tinha uma ligação com a América Latina. Depois,
recebi uma corrente de Roberto Reis sobre o Fluxo, na antiga Alemanha oriental
no início dos anos1970, e entrei no circuito. Foi extraordinário, uma coisa
importantíssima na minha vida. A gente trabalhava em rede; já era uma espécie
de internet antes da internet. Eu, aqui no Recife,sabia o que acontecia no
mundo e vice-versa, no prazo de uma semana, que naquela época era o tempo que
levava para uma correspondência ir ou retornar. A arte correio foi o telegrama,
o telex que eu usei em 1973, foi o fax, que para mim é genial – a transmissão
em tempo real, a questão da desmaterialização e rematerialização da obra de
arte. E essa experiência no Brasil foi feita por mim e Roberto Sandoval. Eu do
Recife; Roberto Sandoval de São Paulo, em 1980, tudo inclusive registrado. Até
que chegou a internet. Ela, para mim, é a consequência lógica;não foi nenhuma
novidade.
DASARTES:
O seu trabalho lida com diversas linguagens experimentais na arte. Passa pela
exploração de meios reprodutivos (xeroperformance), trabalhos no espaço público
e seu ateliê-arquivo, só para citar alguns casos.Ou seja, há um permanente
questionamento sobre a idéia e os limites da arte.Como o senhor pensa tais
questões tanto no seu trabalho atual quanto no cenário contemporâneo hoje?
PAULO
BRUSCKY: Eu acho que arte sempre foi uma forma. Primeiro, eu me deseduquei muito
cedo da utilidade da idéia, que é uma forma mais de ver do que do fazer.
Depois, eu comecei a trabalhar coma arte conceitual, com a instalação, a
performance e diversas mídias. Eu não tenho uma temática. Trabalho com uma
frente muito ampla, nunca tive uma só linha de trabalho. Minha formação é
desenhista. Com 20 anos, ganhei o 1º prêmio de desenho no Salão de Pernambuco e
antes já tinha ganhado vários prêmios com 16, 17 anos. Então você vai dominando
uma técnica e passa a buscar outros horizontes, acho que isso é conseqüência
normal do artista. É feito um sapateiro, como qualquer profissão que você vai
dominando, buscando novas formas. Agora, para mim, a arte está em todo canto,
na forma de vermos as coisas. O artista tem a utopia e existe para mostrar isso
porque, infelizmente, as pessoas não vêem mesmo.
DASARTES:
Em meio às diferentes reações e críticas que o senhor testemunhou em relação ao
seu trabalho, houve alguma que destacaria?
PAULO
BRUSCKY: Não. A minha maior gratificação é esse contato pelo correio, essa
troca de idéia, de conceito. Foram criados novos espaços, porque qualquer lugar
era espaço expositivo. A crítica, as instituições e a imprensa, com raras
exceções, passaram à margem, e isso foi muito bom, foi uma coisa muito da minha
geração. A própria crítica não entendeu o que fazíamos e fomos até, de certa
forma,levados a teorizar sobre nosso próprio trabalho. No entanto, a respeito
de reações, eu nunca analisei qualquer posição crítica sobre o meu trabalho. Se
há alguma sugestão legal, eu incorporo. Se não, não me abala. Sempre fui
criticado, sempre vivi à margem, então me acostumei com a ausência e com
agressões da crítica e por parte da imprensa e do público em geral, apesar de
achar que o público participava muito do que eu fazia.
DASARTES:
Fale um pouco sobre a sua recente exposição no Parque Lage (ENTREIMAGENS,
realizada de 12 de novembro de 2010
a 13 de março de 2011, no Rio de Janeiro), na qual foi
feita um interessante recorte de seu trabalho em torno da poesia, inclusive em
diálogo com o curador Adolfo Montejo Navas, também poeta.
PAULO
BRUSCKY: Para mim foi importante. Em 2002, eu havia feito uma instalação no Rio
de Janeiro que não teve muita repercussão, apesar de eu ter achado tudo genial.
Foi quando eu conheci o Adolfo, que havia participado de um debate. Foi legal
poder expor no Parque Lage, porque pude mostrar meu trabalho de uma forma mais
ampla ao público do Rio, à própria imprensa e à crítica. A exposição também vem
em bom tempo, já que neste ano sai um livro que há cinco anos vem sendo
preparado pelo Adolfo sobre minha obra e a minha trajetória, chamado Poiesis,
que costura essa parte da poesia em todo o meu trabalho. Como é um livro feito
por um artista, faz uma análise muito profunda da minha obra, da qual uma
pequena amostra está nessa exposição no Parque Lage.
DASARTES:
Aquela rede de colaboradores nascidas na arte postal ainda cresce hoje? Há
algum contato que tenha considerado especial?
PAULO
BRUSCKY: Sim, recebo vários convites de pessoas dos anos 1970 e ainda continuo
o contato com uma rede muito significativa: León Ferrari, Anna Banana, Bill
Gaglione, Klaus Groh, vários artistas.Pela internet também continua, mas eu
acho que a internet está sendo inteligentemente muito pouco usada pelos
artistas. É uma ferramenta genial, mas os artistas a utilizam como se usassem
outro meio qualquer de comunicação impressa, mais para divulgar sua obra do que
como um meio mais inteligente para realizar uma obra. Parece que há uma
ansiedade por parte dos artistas de querer logo revisar a obra e difundir.
Talvez faltem mais pesquisas.
DASARTES:
Lembro-me de que o senhor havia sido convidado para lecionar na Universidade
Federal de Pernambuco em 2009 e recusou. Porquê?
PAULO
BRUSCKY: Grande parte dos artistas que são professores estão mais preocupados
com o status de professor e esquecem de ser artistas. E tudo o que você faz tem
que ser bem feito. Logo, para ser um professor, tem que ser um bom professor, o
que é uma responsabilidade muito grande. Uma vida já é muito e você não pode
ocupar duas posições ao mesmo tempo, é uma questão física. Portanto, você tem
que definir o que quer ser. Eu, por exemplo, preferi por muito tempo na minha
vida ser funcionário público. Sabia que minha obra era difícil, que não vendia,
e foi amaneira que encontrei de sobreviver. Hoje me aposentei. Eu agradeço, mas
não me interessa ser professor. Não tenho nada contra, mas escolho usar esse
tempo escrevendo, organizando minhas idéias e mídias, que foram desenvolvidas
há muito tempo e que precisam de um histórico.
DASARTES:
Gostaríamos de fazer-lhe a pergunta que o senhor lançou em uma performance de
1978: “O que é arte? Para que serve?”
PAULO
BRUSCKY: Não sei, no dia que eu souber eu paro (risos). Eu acho que a questão
da arte é uma busca eterna para o artista. Ele está sempre buscando novas
formas de se expressar e de dizer algo ao grande público. Há uma frase que diz:
“Arte é o que o artista faz”. Mas é uma coisa mais ampla, mais profunda. Vou
morrer nessa procura.
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